Novamente pude tomar essa raridade de vinho (só 1.000 garrafas) feito em Garopaba-SC. O vinho no caso é o Cave Ouvidor Insólito 2005. Feito da uva Peverella, que também é conhecida como Malvasia di Vicenza, originária do Tirol na Austria, e que foi introduzida no Brasil em 1930. Uma uva rara hoje em dia no país, pois quase todos vinicultores arrancaram suas plantações para plantar uvas de maior apelo comercial.
O vinho foi feito pelos irmãos Alvaro e Vitor Escher em um sítio em Garopaba, em que não há energia elétrica até hoje. Eles compraram as uvas no Rio Grande do Sul e vinificaram em Garopaba. Não há vinhedos em Garopaba. A primeira vez que ouvi falar desse vinho foi em 2007, através do Ed Motta que teceu elogios de “melhor vinho branco da América do Sul” e “às cegas diria se tratar de um branco natural do Loire”. Ele disse, que quem o tinha apresentado esse vinho foi o Jonathan Nossiter. Mais tarde, lendo o livro Gosto e Poder, descobri que quem apresentou o vinho ao Jonathan foi o Luis Zanini da Vallontano, que considero o verdadeiro descobridor dessa pérola.
Já tive vários contatos com o Vitor Escher para compra de seus vinhos, e no fim de 2009 meu amigo Ricardo Salmeron foi passar o reveillon na praia do Rosa, vizinha ao sítio. Liguei para o Vitor e pedi que recebesse meu amigo para compra de algumas garrafas. Acesso difícil, principalmente em dia de chuva, o sítio fica no alto de um morro, e só carro 4X4 consegue subir. Ao chegar, meu amigo se deparou com nosso Alex Supertramp (personagem do filme Na Natureza Selvagem) e suas centenas de livros espalhados pela casa. Um forasteiro do vinho. Passaram uma tarde tomando seus vinhos e ouvindo estórias de vida, meditação, religião, vinhos, alimentação e tudo mais. Percebe-se que o estilo de vida levado naquele sítio é repassado ao vinho (o Alvaro já não faz mais parte do projeto), totalmente fora do circuito econômico, complexo, difícil de agradar logo de primeira, que te faz prestar atenção e se perguntar se está gostando ou não. Um vinho totalmente na contramão do que é feito hoje em dia em matéria de brancos. Um líquido transgressor, que me faz recordar brancos do Jura, naturais do Loire, brancos oxidados do Veneto, e que para outros lembra um Jerez. Uma cor marrom castanha, oxidada propositalmente, que leva muita gente a crer que o vinho está ruim. No nariz, mel, resina, cera. Na boca pouquíssima acidez, levemente picante e grande untuosidade. Não é um vinho fácil de agradar, principalmente aos iniciantes em brancos. Contrário aos vinhos de hoje, sem nenhum apelo comercial, mas que talvez por tudo isso se torne o vinho maravilhoso que é. Segundo o Vitor, contradizendo tudo que foi noticiado, haverá sim uma nova safra do Cave Ouvidor. Vamos aguardar e torcer que aconteca o quanto antes.
Foto Vitor Escher: Eduardo P.L
Foto da vista do sítio e barricas: Ricardo Salmeron.