O Decantando a Vida, traz dessa vez, uma entrevista com o excelente sommelier Sidney Lucas, que trabalha no grupo Piquiras de Goiânia, e foi citado na coluna do Jorge Lucki, na revista Prazeres da Mesa, como um dos profissionais de destaque no Brasil. Confira:
Conte-nos um pouco da sua trajetória dentro do mundo do vinho (cursos, experiência, por onde trabalhou…)
Meu interesse pelo vinho começou naturalmente, eu já trabalhava no ramo desde os 13 anos de idade nas mais diversas funções. Comecei como faxineiro, balconista, comin, garçon, etc… porém, foi em 1998 que saí de Belo Horizonte para morar em São Paulo com a intenção de estudar na ABS, onde permaneci até o final de 1999. Tendo feito vários cursos oferecidos pela Associação Brasileira de Sommelier, retornei a BH para trabalhar com o Guilherme Corrêa no Vecchio Sogno, dando continuidade ao meu aprendizado com esse que é o melhor sommelier do Brasil. Após alguns meses assumi o Amici Miei, um wine bar cujo proprietário era o mesmo do Vecchio, o Chef Memmo Biadi. Após três anos e meio trabalhando com o Guilherme fui para a Expand Minas contribuindo ali por quatro anos. Fui para a Enoteca Decanter e depois de quase um ano voltei para a Expand Minas, onde recebi a proposta de vir para Goiânia trabalhar no grupo Piquiras onde estou bastante feliz.
O vinho da vez tem sido o do Novo Mundo (Chilenos e Argentinos principalmente). Você acha que isso ocorre, devido a uma falsa ideia, de que oferecem o melhor preço/qualidade?
Certamente está diretamente ligado a isso sim, e durante bastante tempo essa era a realidade, os vinhos europeus que chegavam ao Brasil custavam caro e tinham menos qualidade que os do novo mundo, salvo os de valores mais elevados, que realmente valiam o que custavam, na maioria das vezes. Hoje o panorama está bastante mudado, algumas importadoras tem trazido grandes vinhos europeus com preços compatíveis aos bons vinhos do novo mundo, é possível beber bons italianos, espanhóis, portugueses e de outros países do velho continente, pagando o mesmo que se paga por argentinos e chilenos de preços médios (R$50,00/R$60,00).
No seu trabalho, quais são os vinhos mais pedidos pelos clientes?
Tem uma tendência natural para os vinhos sul americanos, mas na medida que vou apresentando boas opções do velho mundo, a preços parecidos, a maioria aceita e grande parte gosta.
Em restaurantes, pelo menos no Brasil, o vinho tinto predomina em relação ao vinho branco, independente do que se vai comer. Você acha que há chance dessa prática mudar?
Já está mudando, aquela visão equivocada de que brancos, espumantes e vinhos doces são para aqueles que entendem pouco ou são para mulheres, já está indo por terra. Claro que ainda falta entender que além da harmonização entre vinho e alimento o mesmo pode harmonizar com momentos. Imagine-se à beira da piscina tomando um Brunello di Montalcino ou um Barolo, é claro que um Chablis ou um Sauvignon Blanc combina muito mais. Na medida em que a cultura do vinho vai sendo divulgada de forma correta, fica mais fácil para todos compreenderem e aceitarem que os vinhos brancos podem dar tanto prazer, ao serem bebidos, quanto os tintos; depende da hora. O reflexo dessa mudança de pensamento levará o apreciador a pedir o vinho certo para o prato certo nos restaurantes.
A cidade de Goiânia é bem conhecida pelo consumo de cerveja. Como o vinho tem adquirido seu espaço?
Acredito que por dois motivos: hoje as pessoas tem acesso a tudo e a todo tipo de informação, viajam muito, comem em grandes restaurantes no Brasil e exterior, e aos poucos vão adquirindo o hábito de beber vinho ao invés de cerveja, whisky, etc., e também graças à capacidade que o vinho tem de seduzir.
Os restaurantes da cidade têm investido na contratação de um sommelier? Ou ocorre como aqui, onde somente alguns se importam em ter um em seu quadro de funcionários?
Aqui a figura do sommelier é pouco comum, não são todas as casas que investem nesse tipo de profissional. Pode ser que julguem desnecessário, mas a escolha de um profissional de nível costuma trazer benefícios sim.
Qual a sua avaliação do vinho Brasileiro?
Por muito tempo não valia o que custava, de uns cinco ou seis anos para cá isso tem mudado. Já existem vários produtos no mercado com qualidade igual ou superior aos importados de mesmo preço. O que mais dificulta para o vinho brasileiro é a comparação equivocada com os argentinos e chilenos. Comparar a qualidade é uma coisa necessária, mas é preciso entender que o vinho brasileiro não é igual em estilo a nenhum outro, assim como os da Toscana tem sua identidade, os da Bourgogne tem outra, de acordo com suas condições climáticas e de solo. Os vinhos brasileiros não são e não devem ser iguais aos outros, deve ter tipicidade, e na minha opinião, tipicidade o Brasil tem de sobra, não existe nada no novo mundo que pareça (em estilo) com os brasileiros.
Em sua opinião, o sommelier deve provar ou não, o vinho do cliente. Independente de o vinho ter sido pedido no restaurante, ou levado pelo próprio cliente?
Penso que se uma das funções do sommelier é evitar que o vinho chegue à mesa com defeito, ele deve sim provar, independente se é da casa ou se foi levado. O sommelier está alí para prestar um serviço ao restaurante que o emprega, e também para o cliente que prestigia a casa. É dever do profissional averiguar se o vinho está ou não próprio para o consumo e, se não estiver, informar ao clinte, caso o vinho tenha sido levado por ele, ou apenas abrir outra que esteja em totais condições, se tiver sido escolhido da carta do restaurante.
O que você acha dessa evasão dos sommeliers de restaurante, para as importadoras?
Acho mais que excelente, todos ganham. A importadora, além de prestar um melhor atendimento aos seus clientes também terão o auxilio técnico na hora de “garimpar” novos rótulos. Para o sommelier é uma oportunidade a mais de crescimento.
Quais as suas preferências em relação ao vinho?
Procuro anular meu gosto pessoal ao auxiliar alguém na escolha, ou na definição de vinhos para degustações técnicas, portanto, considerando apenas os que me fazem salivar são: os Bourgogne maduros (brancos e tintos), os vinhos do Piemonte, os ribatejanos, os da Ribera del Duero, alguns do Rhône e os brancos alemães. Mas não sou de dispensar os outros não!
Foto:Didier Pinheiro.